A História

    Palavra do Mestre:

    Dentro do lugar de paz, permanecia o Mestre, que falou para Hércules:

    - Ó filho de deus, que sois também um filho de homem, chegou a hora de pisar noutro caminho. Achas-te diante do nono Portal. Passa por ele e dirige-te ao pântano de Estínfale, onde moram os pássaros que fazem estragos. Descobre depois o meio para fazê-los voar de sua segura morada por muito tempo. A Chama que brilha além da mente revela a direção segura - e acrescentou - A tarefe te aguarda. Deves passar agora através do nono Portal.

    Hércules procurou durante muito tempo, até que chegou à Estínfale. Ante ele, estendia-se um fétido pântano. Um bando de pássaros grasnava roucamente, de forma ameaçadora e dissonante, à medida que ele se aproximava.

    Olhando de mais perto viu os pássaros. Eram grandes, ferozes e horríveis. Tinham bicos de ferro, afiados como uma espada. As penas ambém, como dardos de aço, podiam partir em dois a cabeça dos fatigados viajantes. Suas garras se igualavam a seus bicos em agudeza e força.

    Três pássaros, percebendo a presença de Hércules, precipitaram-se sobre ele. Ele se manteve em seu lugar e aparou os ataques com a pesada clava que sustentava. Golpeou as costas de um dos pássaros, de forma ressoante, e duas penas caíram verticalmente ao solo e tremularam enquanto afundavam na terra frouxa. Finalmente, os pássaros se retiraram. Hércules permanecia diante do pântano e refletia como poderia realizar a tarefa que lhe foi deferida, ou seja, como livrar o lugar dessas aves de rapina. Procurou muitos meios para encontrar uma maneira de consegui-lo. No princípio tentou matá-las com seu arco e o carcaz que estava cheio de flechas. Os poucos que matou não eram senão uma fração dos muitos que ficavam. Elevavam-se em nuvens tão espessas que ocultavam o sol.

    Pensou em colocar armadilhas dentro do pântano; nem barca nem pés humanos podiam atravessar o lamaçal.

    Hércules meditou e lembrou então as palavras de conselho que seu Mestre lhe havia dado. Refletindo por um longo tempo se lhe ocorreu um método, lembrou que tinha dois grandes címbalos de bronze, presentes da deusa Ateneia, que emitiam um som agudo e sobrenatural; um som tão penetrante e tão desagradável que podia assustar até os mortos. Para o próprio Hércules, o som era intolerável, que teve de tapar os ouvidos com duas almofadinhas, tal foi o desconforto que sentiu.

    Na hora do crepúsculo, quando o pântano estava repleto de inumeráveis pássaros, Hércules golpeou os pratos dos címbalos com vigor várias vezes, e um estrondo estridente sobreveio que até ele mesmo mal podia suportá-lo. Tal dissonância jamais tinha sido ouvida em Estínfale.

    Aturdidos e perturbados por tão monstruoso ruído, as aves se elevaram no ar com as asas de bronze batendo selvagemente e chilrando com ronco desalentado. Completamente perturbada, a vasta nuvem de pássaros fugiu com pressa frenética, para nunca mais regressar. O silêncio se difundiu stravés do pântano. As aves horríveis tinham desaparecido.

    Quando Hércules regressou, o Mestre lhe saudou:

    - As aves de rapina foram afugentadas. O trabalho está cumprido.

Comentário

    1 - Em Áries, Hércules prendeu as éguas comedoras de homens, mas falhou na tarefa quando tripudiou da importância da mesma e entregou as éguas aos cuidados de Abderis, que foi morto e obrigou Hércules a refazer a tarefa.

    2 - Em Sagitário, afugenta definitivamente as aves assassinas do Estínfale, ou seja, enfrenta o mesmo problema no plano da mente em que, por meio da meditação, demonstra completo controle do que é a primeira coisa que o aspirante à iniciação tem de fazer. Ou seja, controlar a palavra, pois as três aves que lhe atacam são murmuração, (a reclamação de não ser compreendido pelos outros), conversação deletéria (ou seja, o cuidado com a palavra proferida) e intolerância em relação às verdades alheias, ou seja, a prática da "minha opinião é que deve prevalecer".

    3 - As três aves maiores entre milhares de outras são os pensamentos errôneos que o Estudante ainda abriga dentro de si e que precisam ser afugentados definitivamente do lamaçal de sua mente inferior - a fim de que ele realize uma vida de completa inofensividade e tenha condições de enfrentar a prova em Capricórnio.

    4 - Sagitário é o signo preparatório para Capricórnio, sendo chamado o "signo do Silêncio". Nos mistérios antigos, o Irmão recentemente admitido tinha de sentar-se em silêncio; não lhe era permitido nem caminhar nem falar; tinha de estar presente, trabalhar mentalmente e observar, porque ninguém pode entrar no quinto reino da Natureza (Evolução dévica ou Angélica) até que tenha conquistado absoluto controle sobre a palavra e o pensamento.

Templo Maçônico - Helvécio de Resende Urbano Júnior 33º